Jogos e brincadeiras africanas: o brincar que nasce do chão

Entenda mais sobre o brincar e conheça algumas dicas de jogos e brincadeiras africanas e/ou afro-brasileiras.


Jogos e brincadeiras africanas: o brincar que nasce do chão

Escrever sobre o brincar, o lúdico, a criatividade pressupõe entender que são processos contínuos que não têm um fim em si mesmo. Todavia, fica o convite para pensar, refletir e agir de modo brincante, criando outras intervenções, propostas e ações que, possivelmente, podem culminar em outras formas de defender o lúdico que habita em você e em nós.

O brincar faz parte da cultura e, quando propiciamos um espaço brincante, ajuda crianças a desenvolver a criatividade, a ampliar a sensação de liberdade, sendo esta capaz de ser autônoma e autora de sua própria história. Por falar de história, os jogos nos conectam com os contextos sociais, os povos e as nações, logo, conhecer as suas origens e seus desdobramentos nos permitem ampliar os nossos repertórios lúdicos, culturais e africanos.

Tanto que, neste texto, selecionamos algumas dicas de jogos e brincadeiras africanas e/ou afro-brasileiras, com a finalidade de articular teoria e prática para que educadores e professores possam conhecer outras maneiras de tornar o chão da escola mais plural e a vivência lúdica mais rica onde priorize a cultura popular, o brincar que nasce do chão e que sua discussão central é a cultura africana. Como diz, a poeta e professora, Denise Cruz, em nossa obra: “Tenho direito ao brincar nascido do meu chão. Heranças repletas de aprendizagem e diversão. Vindas dos meus ancestrais. Tenho direito a outras formas de brincar. Que trazem as histórias de meus antecessores. E, que de mim, contem mais!”

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Olhar para o brincar e para as africanidades brasileiras é dizer que somos lúdicos e criativos e que todo o processo desde o movimento de contar uma história, se encantar com as narrativas, aprender com as singularidades e os pertencimentos da cultura africana nos mostram que a essência lúdica nasce do chão, do corpo, da mente, do olhar para dentro de si e se conectar e interagir com o outro. Eis aí o caleidoscópio lúdico existindo, reexistindo e possibilitando processos de interação entre um sujeito integral, até porque não somos partes isoladas, somos todos em um.

O brincar é o encorajamento diante das marcas de exclusão. É subversivo, é resistência e reexistência. Em uma favela onde o confronto e os conflitos armados acontecem todo dia (e, que atravessam a vida de crianças e jovens negros), uma criança que brinca, que ri e que se encanta está se rebelando, está demonstrando que o sistema que foi feito para matá-la não venceu! Mesmo diante de tantas mortes que são noticiadas entre os corpos negros.

Além disso, o brincar é o estímulo para romper com as dificuldades de aprendizagem e ensinagem. O brincar é o elo de culturas, cores, sensações e sabores. Por fim, o brincar é o nascer. E, para se nascer e florescer, é preciso de cuidado. Que nossas crianças sejam cuidadas pelo zelo, pelo espaço de segurança e confiança.  Que os adultos se tornem pontes entre sorrisos, lágrimas e o desafio de educar construindo uma cultura de paz. O brincar é essência, o brincar nasce do chão!

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SHISIMA

 

Objetivo: mover as peças de modo que forme uma linha reta. 

Participantes: a partir de dois jogadores.

Shisima é um jogo de estratégia que tem sua origem no Quênia. Para iniciar a partida, os jogadores deverão sentar-se um de frente para o outro. Cada participante receberá três peças que deverão ser colocadas em cada lado oposto. Um jogador, por vez, move uma de suas peças pela linha, até o espaço vazio. A finalidade é movimentar as peças no tabuleiro de modo que se crie uma linha reta com elas. O primeiro que colocar as suas peças em linha reta vencerá a partida. É importante lembrar que, se um jogador repetir o mesmo movimento por três vezes, a partida se encerrará com um empate. Com isso, um novo jogo é iniciado.

Shisima (Estrututura). Fonte: Aguiar e Pinheiro (2020).

Criança jogando Shisima com tampinhas de garrafa. Fonte: Aguiar (2022).

Shisima quando é usado sem um fim para a aquisição de conhecimentos específicos de uma determinada área curricular (Matemática) pode ser considerado um jogo educativo amplo por oportunizar a experiência lúdica do ser brincante entre o manuseio das peças e o ouvir seus colegas enquanto jogam. A função do jogo é também aproximar sujeitos, permitir as manifestações imaginárias e a socialização de histórias, conquistas e, por fim, lidar com as emoções. O perder e o ganhar fazem parte do jogo, fazem parte do brincar e, nessa ação lúdica, abrem-se outras possibilidades de interação.

Dicas Brincantes

• O tabuleiro pode ser desenhado em uma folha, rabiscado no chão ou em qualquer outra superfície propícia.

• As peças podem ser sementes, tampinhas de garrafa, bolinha de papel amassada ou até objetos pequenos.

 

OSANI

 

Objetivo: relatar objetos e coisas redondas. 

Participante: a partir de três participantes.

A brincadeira Osani tem origem da República Democrática do Congo, da floresta de Ituri. Esta brincadeira possui significados e conhecimentos milenares. Os participantes sentam-se juntos, uns dos outros, com as pernas esticadas para o centro do círculo. Lembre-se de que os pés devem estar alinhados, formando uma muralha protetora. Aí o brincar começa! Cada participante deve dizer o nome de algo redondo: -Olho! diz o menino. -Sol! -Lua! -Planeta Terra!... A pessoa que não consegue falar o nome de algo redondo deve sair da brincadeira. A criança ou o adulto que conseguir ir até o final é a que vencerá o Osani.

Todos os redondos e a expressão do brincar. Fonte: Aguiar (2022).

Você sabia que a brincadeira é a expressão da linguagem e da cultura. É por meio dela que nos constituímos em sujeitos e construímos a nossa identidade social e cultural. Há inúmeras formas de brincar e se relacionar com o mundo, o universo, a natureza e os territórios que estão inseridos. Brincar é criar vínculo. É se envolver com as nossas imaginações e com aqueles que nos convidam a brincar. Nessa perspectiva, a brincadeira acontece em pé, sentado, com os olhos abertos, com os braços levantados e qualquer outro movimento. Portanto, o corpo também é um elemento lúdico e necessário na arte de brincar. Dito isso, as crianças sentam-se em roda, os adultos se juntam e participam da brincadeira, o Osani pode propiciar toda essa experiência lúdica.

 

MAMBA

 

Objetivo: fugir da cobra, sendo o último a ser pego. 

Participantes: a partir de cinco pessoas.

Mamba é originário da África do Sul. Para realizar essa brincadeira, primeiramente, devem-se marcar e estabelecer os limites da área do jogo. Após isso, um jogador deve ser escolhido para ser Mamba (cobra). O participante que for eleito cobra deverá correr ao redor da área marcada tentando apanhar os outros. Quando um dos demais participantes for pego, ele segurará sobre os ombros ou a cintura do jogador que representa a cobra e, assim, o ajudará na caça dos outros jogadores sucessivamente. Somente o primeiro jogador (a cabeça da serpente) pode pegar outras pessoas. Os outros jogadores do corpo podem ajudar não permitindo que os adversários passem, pois estes não podem passar pelo corpo da serpente. O último que for pego vencerá.

Crianças brincando de Mamba Fonte: Aguiar (2022).

A brincadeira Mamba nos leva por meio dos seus aspectos lúdicos a criar associações, a desenvolver as habilidades intelectuais e motoras onde põe em evidência o ato de correr, pegar, pular que fazem parte das aptidões físicas. Assim, também, a reflexão de solucionar os conflitos que surgirem entre ganha e perde a própria brincadeira, sabendo que ela res gatará o valor da cooperação. Outro aspecto que podemos perceber é a inversão de papéis, na qual, uma hora, o participante está fugindo da cobra para não ser pego, já na outra, ele faz parte da cobra e ajuda a capturar os demais participantes. O mais encantador de brincadeiras nesse sentido é a liberdade para ser “herói” e “vilão” em um curto período.

Dica Brincante

• Para inovar na brincadeira, os participantes que forem pegos poderão ter de passar por debaixo das pernas do que foi escolhido como cobra, em vez de somente irem segurar no ombro.

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Autores do artigo:

Jonathan Aguiar - Doutor e Mestre em Educação. Pedagogo. Professor da Universidade Federal Fluminense vinculado ao COLUNI. Pesquisador Científico do Grupo de Pesquisa em Artes e Visualidades e Laboratórie de Estudos, Pesquisas e Apoio à Participação e à Diversidade em Educação.  Autor do livro "Jogos e Brincadeiras Africanas: o brincar que nasce do chão", "Os Excluídos podem Sonhar, Brincar e Criar: por uma educação que transforma humanos" e "Educação, Lúdico e Favela: quantos tiros são necessários para aprendizagem" publicados pela Wak Editora.

Matheus Pinheiro - Pedagogo. Especialista em Literatura Infantil. Graduando em Letras com Literaturas na UNIRIO. Integrante do Grupo de Estudos e Pesquisas GIIL - Grupo de Investigação de Infâncias e Linguagens.  Autor do livro "Jogos e Brincadeiras Africanas: o brincar que nasce do chão" publicado por Wak Editora.  


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