Jackie

Narra o processo instigante e marcante do luto para a autodescoberta política da figura controversa que foi Jackie Kennedy


Natalie Portman, caracterizando a primeira dama Jckie, em um vestido vermelho e um corte curto dentro da Casa Branca

São poucos aqueles que param e pensam a respeito do que acontece logo após um acontecimento histórico memorável. Qual o rumo dos acontecimentos? O que ocorre com os personagens envolvidos? Se pensarmos, por exemplo, numa solenidade como aquela em que ocorreu a assinatura da Lei Áurea no Brasil, pela princesa Isabel. Para ela e a família real, uma medida de tamanha envergadura, em seu cotidiano, o que significou na prática esta mudança nos momentos e dias seguintes ao ato? Se pensarmos nos tratados que encerraram conflitos, como as duas grandes Guerras Mundiais ocorridas no século XX, para os representantes dos países vencedores e derrotados, especificamente, o que significou cada momento a posteriori? No desenrolar dos minutos, das horas e dos dias logo após os fatos marcantes para a vida de toda a humanidade, em particular, para cada um dos signatários, o que aconteceu?

E no que se refere a uma tragédia, como o assassinato de John Kennedy?

É possível para nós percebermos o que deve ter passado pela cabeça de sua esposa, Jaqueline Kennedy, nos segundos e minutos em que, logo após o disparo ter atingido a cabeça de seu marido, com ela sentada a seu lado, em carro aberto, desfilando por Dallas, no Texas?

Talvez suas expressões, ações e palavras naquele momento sejam passíveis de interpretações por cada um de nós já que as imagens do atentado ao presidente americano foram logo distribuídas mundo afora pelas redes de TV a partir do momento em que identificaram alguém na multidão que havia registrado o ocorrido.

O que, no entanto, se passava na cabeça de Jackie, como era conhecida mundialmente, a elegante primeira dama dos Estados Unidos?

Depois dos tiros desferidos, o carro que levava Kennedy foi imediatamente deslocado para o hospital mais próximo e, ainda que as balas tenham atingido o crânio do presidente, o socorro foi tentado pelos médicos e equipes ali disponíveis. Já era tarde, como ficamos sabendo, JFK chegou morto as dependências daquele hospital.

Coloque-se, no entanto, no lugar de Jackie, a amparar o corpo desfalecido do marido, o homem mais poderoso do mundo até aquele momento, em seus braços, com pedaços da massa encefálica dele espalhadas por seu rosto, mãos e roupas, com sangue ao redor e também em si mesma...

A angustiante espera no hospital, cercada de assessores, políticos, policiais, agentes do serviço secreto, médicos, familiares e tantas outras pessoas sem poder entrar na sala em que o corpo inerte de seu esposo era examinado pelos legistas.

Enquanto ela lidava com o luto e a preparação do velório e enterro, até mesmo antes disso, as mudanças políticas já eram processadas e Lyndon Johnson, vice-presidente americano, era empossado em lugar de seu marido.

Em “Jackie”, estrelado por Natalie Portman (em atuação de primeira, tendo sido inclusive indicada ao Oscar) e dirigido por Pablo Larrain, é justamente isso o que acontece, com o espectador sendo levado, depois de um grande acontecimento, a entrar na mente de uma das mais importantes e proeminentes primeiras-damas dos Estados Unidos, tendo por base uma entrevista concedida por ela alguns dias depois do ocorrido, que serve como mote e fio condutor da trama.

Filme denso, carregado no aspecto emocional, que procura desvendar os elementos psíquicos relacionados ao ocorrido a partir da personagem título, historicamente localizado que, por sua montagem nos permite não apenas repensar o assassinato de JFK, mas ampliar o foco e tentar compreender outros momentos históricos a partir da ótica de envolvidos próximos, como Jaqueline Kennedy. Imaginem se pudéssemos pensar, por exemplo, em outros eventos igualmente trágicos na esfera brasileira ou mundial, como o suicídio de Getúlio Vargas ou os assassinatos de Gandhi ou John Lennon.

A grande contribuição de uma produção de qualidade como “Jackie” reside justamente nesta possibilidade de nos fazer repensar a história, buscar outros elementos, protagonistas, narrativas, pontos de vista diferenciados, de pessoas próximas ou mesmo distantes, apenas com o intuito de oferecer uma perspectiva mais ampla e completa dos fatos. Só por isso um filme como este já é um grande presente para o público. Além disso há direção firme e precisa, roteiro inteligente, cenários e figurinos de altíssima qualidade e Natalie Portman praticamente incorporando Jaqueline Kennedy, num verdadeiro show de interpretação. Um grande filme!

 

Para refletir

1. Volte no tempo. Faça um exercício de inserção no momento histórico que estiver estudando, como neste caso, no assassinato de John Kennedy. Assuma um personagem presente naquelas cenas. Tente entender seus movimentos e sentimentos, a forma como se comporta e as motivações para tal. Procure ampliar a cena e perceber o que tudo aquilo significou para o mundo, o contexto em que aconteceu, a Guerra Fria, o conflito entre americanos e cubanos, a corrida espacial, a luta pelos direitos civis... Crie relatos escritos como se fora tal personagem, por exemplo, Lyndon Johnson, Robert Kennedy ou a própria Jaqueline Kennedy. Ações desta natureza nos levam a entrar nas páginas dos livros de história e, com isso, nos permitem entender melhor tudo o que estava acontecendo então...

 

2. O contexto do assassinato de JFK já foi retratado em vários filmes interessantes. Que tal montar uma mostra com títulos como “Jackie”, “JFK – A pergunta que não quer calar”, “Estrelas além do tempo”, “Os Eleitos”, “Treze dias que abalaram o mundo”, “Solaris”, “Dr. Fantástico”, “Boa noite, boa sorte” e tantos outros. Desta forma a compreensão do período ficará mais clara e também os temas de então, como a Guerra Fria, o Macarthismo, a luta pelos direitos civis, a corrida espacial, entre outros, ficam mais familiares para quem está estudando e se preparando para o ENEM, vestibulares e avaliações escolares.

 

3. Qual é o legado de Kennedy? Fala-se muito desse presidente, mas o que JFK deixou para os Estados Unidos e o mundo? A Guerra do Vietnam, por exemplo, foi obra de John Kennedy? O reconhecimento dos direitos civis, foi legado deste presidente? Construir uma linha do tempo analítica do período de governo de Kennedy é uma proposta interessante para entender melhor o que ficou para quem veio ao mundo depois deste conhecido, destacado e, por vezes, controverso líder norte-americano.

 

Veja o trailer:

 

Ficha Técnica

  • Título: JACKIE
  • Título original: Jackie
  • País/Ano: EUA, 2017
  • Duração: 100 minutos
  • Gênero: Drama, Biografia, História
  • Direção: Pablo Larrain
  • Roteiro: Noah Oppenheim
  • Elenco: Natalie Portman, Peter Sasgaard, Greta Gerwick, John Hurt, Billy Crudup, Richard E. Grant, John Carrol Linch, Beth Grant, Caspar Phillipson.

João Luís de Almeida Machado

João Luís de Almeida Machado

Consultor em Educação e Inovação, Doutor e Mestre em Educação, historiador, pesquisador e escritor.

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