A importância do trabalho em pares

A ação colaborativa e enriquecedora entre faixas etárias e níveis escolares


Seleção júnior de futebol se abraçando

“Peer Education” é uma expressão da língua inglesa que define o trabalho em pares, ou seja, entre aqueles que são próximos, que estão num mesmo segmento ou faixa etária, ou seja, entre alunos de uma mesma sala de aula e nível escolar.

Não estamos falando aqui de projetos ou trabalhos escolares que reúnem estudantes para que desenvolvam atividades planejadas e programadas previamente por seus professores. Pode ser, e na realidade deve ser, uma ação prevista, planejada e programada pela escola com o intuito de melhorar o rendimento de seus estudantes, promovendo a aproximação e a troca entre eles. Pode, evidentemente, abarcar desde ações do cotidiano, como a realização de tarefas, trabalhos escolares ou atividades na própria sala de aula. Deveria ser prática constante e regular para que sedimentasse entre as crianças e adolescentes a capacidade de compartilhar, trocar, se ajudar mutuamente desde a mais tenra idade, gerando assim o ensejo da ação fraterna, amiga e colaboracionista. É possível que nasça de forma espontânea entre os alunos, o que seria rico e valioso, mas que dependeria, evidentemente de maturidade e exemplos da vida real para se concretizar.

“Peer to peer” significa, na prática, a possibilidade de “iguais” trocarem figurinhas, ou seja, de alunos que estão estudando matemática ou ciências se sentarem logo após a aula para se ajudarem mutuamente quanto aos conceitos por eles aprendidos, numa linguagem mais própria e aproximada, sem as tensões da dúvida surgida no calor da aula e da vergonha que eventualmente possa acometer um ou outro no que se refere a levantar a mão e perguntar para o professor o que não foi compreendido.

Esta tão valiosa parceria é, muitas vezes, desprezada pela escola ou mal utilizada por ela. Quando pensamos em monitoria, por exemplo, o que sucede é justamente a ação da explicação por parte de um dos alunos, que melhor compreendeu os conceitos de biologia ou geografia, em relação a outro que teve maior dificuldade. As escolas, no entanto, ao adotar este procedimento, quando o utilizam, focam apenas nos alunos que mais se destacaram e, por vezes, ignoram a possibilidade de oferecer a outros, com rendimento mediano e potencial para estes estudos e áreas, a chance de se aperfeiçoar, tornando-se também eles monitores. Relatos de gestores e professores que adotaram esta estratégia são, literalmente, de arrepiar, pois descrevem como estudantes que não estão entre os melhores de suas turmas, ao serem incluídos na monitoria de uma ou outra disciplina, passam a estudar com mais afinco, fazem mais séries de exercícios, aprofundam sua leitura e, com isso, se fortalecem enquanto explicam para outros colegas.

As pesquisas demonstram que um dos maiores níveis de apreensão e entendimento de conceitos e ideias relaciona-se a capacidade ou condição de ensinar uma outra pessoa. Não basta escutar, mesmo que com máxima atenção o que o professor está ensinando em sala de aula; fazer atividades reforça o conhecimento, é claro, mas lacunas podem permanecer; assistir videoaulas ou animações e simulações na internet, ainda que de fontes fidedignas, é também alternativa de valor para quem busca se aprofundar nos estudos; no entanto, a apropriação real e a compreensão maior dos saberes se dá quando os educandos explicam para os demais o que lhes foi traduzido em aulas.

O “peering”, ou seja, a prática regular das trocas de saberes entre os alunos pode ser feita todos os dias e não apenas por meio da monitoria. Iniciar as aulas com alguns minutos dedicados a formação de duplas em que os alunos auxiliem uns aos outros é uma alternativa; finalizar as atividades letivas com tempo para revisar os conceitos com apoio do colega ao lado é outra prática simples que pode e deve ser estimulada.

O uso desta estratégia no que se refere as tarefas escolares é, também, alternativa valiosa. É importante salientar que tais ações podem ser ainda bastante eficientes para aproximar os colegas, quebrando barreiras ou estereótipos previamente estipulados, fazendo com que no “peering” prevaleça, por exemplo, sempre que possível, uma alternância entre os pares formados e dando chances para todos.

Para reforçar a autoestima dos alunos e lhes dar maior confiança não apenas a ação dos docentes ao elencar alunos com rendimento mediano e potencial é importante. Se o projeto é realizado por docentes de diferentes áreas o brilho de alguns em matemática e de outros em inglês ou história pode igualmente aparecer e salientar que todos têm como contribuir, enriquecendo o grupo, sendo solidários e colaborativos.

O trabalho em pares auxilia também os alunos no que tange a maior responsabilidade pois assumem, por meio das ações por eles desempenhadas, de dar suporte para seus colegas, o compromisso de estarem em dia com seus estudos, compreendendo da melhor forma possível os conceitos que estão ensinando, realizando as atividades com antecedência, estudando além daquilo que foi trazido em sala de aula... Passam a ter mais foco e objetividade em seu trabalho escolar e isso repercute para além da sala de aula, com repercussões para toda a sua vida.

Acima de tudo, se a proposta faz parte do projeto político-pedagógico da escola, a tendência é que isso se torne cultura na instituição e, ao mesmo tempo, que se dissemine mais facilmente entre alunos, professores, gestores e até mesmo entre as famílias.

As escolas precisam agir de forma a tornar sua atuação mais ampla em relação a sociedade, fomentando ações, valores e práticas que redundem para todos, indo além dos conteúdos e saberes. Neste sentido, conter no DNA da unidade educacional a prática da troca, do compartilhamento, do trabalho em pares, tanto entre alunos quanto entre os demais membros de sua comunidade, ampliando este tipo de ação até mesmo para projetos e trabalhos de âmbito social exponencia o aprendizado e o faz se tornar algo que transcende a vida escolar dos alunos, fazendo com que se torne algo para suas vidas.

Precisamos muito mais disso do que nos damos conta e, ao assim agir, as escolas plantam as sementes para um mundo em que a colaboração reine sobre a competição mesquinha, construindo um mundo melhor, mais fraterno e feliz para as próximas gerações.

Mais que exemplos, precisamos de ações que demonstrem o quanto a humanidade é capaz de fazer o bem.


João Luís de Almeida Machado

João Luís de Almeida Machado

Consultor em Educação e Inovação, Doutor e Mestre em Educação, historiador, pesquisador e escritor.

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