Trabalho x mais horas = Maior produtividade e qualidade no trabalho?
Expectativas irrealistas combinadas com longas horas estão aumentando os níveis de estresse dos trabalhadores
…em todas as posições que ocupei, tentei criar um ambiente de profissionalismo nos mais altos padrões. Quando precisava terminar alguma tarefa, eu esperava que meus subordinados trabalhassem direito. Quando não era necessário, queria que eles trabalhassem o expediente normal, fossem para casa num horário decente, brincassem com seus filhos, se divertissem com a família e os amigos, lessem um romance, espairecessem, devaneassem e se revigorassem. Queria que tivessem uma vida fora do escritório. Estou pagando pela qualidade do trabalho, não pelas horas que cumprem. Esse tipo de ambiente sempre me rendeu os melhores resultados.” (General Colin Powell)
Destaco as palavras de Colin Powell ao mesmo tempo em que me lembro de um programa que vi na televisão, sobre um dos países nórdicos, onde impera a social-democracia, no qual um dos entrevistados afirmou que naquele país eles viviam dentro de uma lógica na qual as 24 horas de um dia estavam divididas em 3 blocos de 8 horas, sendo que uma parte seria para o trabalho, a segunda para a pessoa e suas necessidades e relacionamentos e a terceira para o descanso merecido.
Num momento como o que vivemos, no qual a globalização compele países, corporações e pessoas ao trabalho insano, numa busca de rentabilidade e, como base para isso, produtividade extremada, as duas afirmações destacadas em diferentes contextos tem como propósito abrir nossos olhos para a necessidade de equacionarmos melhor a vida individual e coletiva.
Hoje temos crianças e adolescentes adoecendo, tendo males que até pouco tempo atrás eram exclusividade de adultos ou idosos, por conta do excesso de atividades e cobranças. Jovens recém-chegados ao mercado de trabalho que, apesar de toda a disposição, igualmente acabam enfermos por excessos visando valorização profissional. Socialmente percebemos o crescimento de casos de famílias desfeitas por falta de vínculo que, convenhamos, está associado ao tempo que as pessoas precisam estar juntas e não estão.
E as repercussões disso para a cabeça de cada indivíduo, quais são? A solidão, o medo, a angústia, a desesperança e a busca por remédios, tratamentos ou então por paliativos como o consumo, de bens e pessoas, que não preenche e nem resolve os dramas internos de cada um e de todos.
Socialmente vivemos a instabilidade da perda de trabalho como um dínamo que mobiliza as pessoas a loucuras como ficar 10, 12 ou mais horas a serviço, sem contar que pelas tecnologias estamos 24 horas à disposição. A violência cresce e há um contingente de pessoas atormentadas sem que nem mesmo percebam que suas neuroses estão associadas a esta questão do trabalho que não acaba nunca, das cobranças que não cessam nem quando fora do ambiente profissional.
As palavras do general Colin Powell, profissional respeitado, que ocupou cargos estratégicos no governo americano e que foi, inclusive, cotado para ser candidato a presidência dos Estados Unidos, precisam ser apreciadas por todos, ponderadas e pensadas juntamente a outras importantes contribuições, nas quais se destaca a necessidade de melhor viver demandada por todos os seres humanos, sem exceção.
Quando ele afirma que está “pagando pela qualidade do trabalho, não pelas horas que cumprem” seus colaboradores, Powell nos estimula a rever procedimentos e práticas que não são salutares para os trabalhadores.
É compreensível que as empresas, num ambiente de feroz competição mundial, busquem aumentar sua produtividade, mas o uso de expedientes e ferramentas tayloristas e fordistas não é a resposta num mundo onde boa parte do trabalho não é mais como era antigamente, ou seja, com uma demanda muito maior por serviços do que de produção direta, propriamente dita, como numa linha de produção.
Empresas de tecnologia do Vale do Silício atuam de forma competitiva mas sabem que devem gerar contrapartidas a seus colaboradores e não apenas bons salários, mas também qualidade de vida, caso contrário estes profissionais podem debandar e a busca por pessoas que os substituam vai gerar custos ainda maiores, de treinamento, adequação a cultura da empresa, validação de processos e formas específicas de trabalhar, conhecimento pleno dos serviços e produtos…
Já apregoavam os gregos na Antiguidade que é preciso “Mens sana in corpore sano” (Mente sã em corpo saudável) ou ainda o sociólogo italiano Domenico de Masi, em seu clássico livro, “O Ócio Criativo”, que o homem precisa de tempo para fruir pois somente assim será capaz de fazer fluir sua vida e obra.
João Luís de Almeida Machado
Consultor em Educação e Inovação, Doutor e Mestre em Educação, historiador, pesquisador e escritor.
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