As derrotas do cotidiano e como transformá-las em vitórias
Como aprender a viver bem e amadurecer com as lições
Horário de intervalo das aulas. A menina chora copiosamente. Pouco antes de tocar o sinal a professora de matemática entregou as provas aplicadas uma semana antes. A estudante, uma das melhores da sala e da escola, tinha tirado nota abaixo da média. Era a primeira vez que isso acontecia em sua vida escolar. E ela já estava no ensino médio... por isso as lágrimas sentidas de quem até então tinha passado de forma impune pelos bancos escolares.
O experiente professor, com titulações e cursos já realizados, muitos anos de sala de aula, resolvera tentar o ingresso na vida acadêmica. Se inscrevera para um concurso público de reputada instituição universitária federal. Até então sua vida profissional tinha sido de realizações e reconhecimento, sempre entrando a convite, pela porta da frente, nas escolas e empresas nas quais trabalhara. Estudou, como sempre, atento ao programa do concurso. Foi a cidade onde se realizaria a prova, se submeteu as diferentes modalidades de avaliação (prova escrita, de títulos e didática) e foi para entrevista final bastante satisfeito com seu rendimento até então, consciente do bom trabalho que tinha realizado. Na entrevista, apesar de seguro, a primeira pergunta já o desconsertou...
- O que você está fazendo aqui? Emendou um dos membros da banca.
- Você é especialista em outra área e não naquela do concurso em andamento...
A partir daí, é claro, ele já sabia que seu destino não era assumir a cadeira em concurso na universidade em que estava realizando as provas...
Anos de dedicação a função e a expectativa de assumir a função de gerente do departamento era grande para aquele profissional. A saída do seu antigo gestor abria a oportunidade que ele esperou pacientemente, construindo dia após dia, com grande profissionalismo, respeito pelos colegas, ética, estudos e eficiência, seu impecável retrospecto na empresa. Alguns dias se passaram e ninguém da diretoria o chamou. Sabia que seu nome estava em pauta pois o antigo gerente o indicara. Imaginou que o final do mês seria o momento mais apropriado para que o chamassem. Acertou o período, mas não a pessoa... no último dia daquele mês de março a empresa apresentou o novo gerente para todos...
Todas estas histórias são reais, baseadas em pessoas que como eu ou você trabalham arduamente e que com isso alimentam seus sonhos, suas expectativas de melhores resultados, de promoções e reconhecimento.
Quando isso não acontece vem sempre a dúvida, a busca dos erros cometidos, a culpa que é nossa, mas que por vezes atribuímos a outros, e a desvalorização de tudo o que foi feito por conta de um resultado infeliz, de uma meta não atingida, da valorização que não veio... perde-se a confiança e o que foi bem feito, as conquistas realizadas, as vitórias obtidas são enevoadas pelo fracasso ou insucesso momentâneo.
Nesse momento me lembro imediatamente de grandes nomes como Walt Disney, Steve Jobs, Charles Chaplin, Roberto Carlos e outros grandes realizadores (sugiro a leitura da biografia destes expoentes para conhecer seus percalços) que em algum momento de suas vidas viveram fracassos consideráveis e, ainda assim, recomeçaram acreditando que poderiam ser bem-sucedidos. Aqui reside o primeiro e importantíssimo passo após uma derrota, ou seja, lembre-se que você não é o único e que gente muito bem-sucedida já passou por isso e virou o jogo porque acreditaram em seus sonhos e continuaram batalhando por isso.
Depois disso, que tal pensar no que aconteceu, já tendo passado pela dor e sentimento de derrota sempre comuns nestes casos? O segundo passo para superar este insucesso momentâneo é avaliar o que aconteceu, com o máximo de frieza possível, identificando o que pode ter ocasionado a nota baixa, a promoção que não veio, a aprovação esperada que não aconteceu... Mapear os acontecimentos, suas ações, os pontos fortes e as fragilidades evidenciadas é uma forma de se fortalecer pois irá permitir, adiante, que as deficiências percebidas possam ser sanadas, corrigidas e superadas numa nova oportunidade.
Se o que faltou foi maior foco nos estudos, invista nisso. Se faltou empatia, é possível melhorar nisso, que tal ler algumas obras que falam sobre o assunto. Se o problema foi o excesso de especialização, talvez seja melhor focar somente naquilo em que realmente é seu ponto forte; se, no entanto, quiser mudar de área, estude e trabalhe por esta mudança.
Pessoalmente posso dizer que já sofri minhas derrotas e que foram doídas, como a de todas as pessoas. A queda é algo comum a todos que vivem a experiência humana. Aprender com as derrotas, no entanto, não é algo tão comum quanto se pensa ou se apregoa. Temos, infelizmente, a tendência a buscar em terceiros os motivos de nossos fracassos. É evidente que, por vezes, isso realmente pode acontecer... Preferências de quem decide, falta de entrosamento ou, simplesmente, inveja e eventual sabotagem por conta de quem resolve a situação são possibilidades aqui e em qualquer lugar do mundo, infelizmente. Não prevalece a meritocracia, em especial no Brasil, onde parentesco, amizade e outros tipos de relação e proximidade acabam sendo fatores decisivos.
O que fazer em relação a isso?
É preciso, inicialmente, assumir os erros e problemas que são parcela nossa e trabalhar em relação a eles para que não sejam cometidos novamente. Se há fatores externos a sua ação que decidem os projetos, promoções ou avaliações positivas ou negativas, ao se respaldar e oferecer o melhor possível dentro de suas possibilidades você estará deixando esta pessoa ou grupo de pessoas sem argumentos para derrubar você no que se refere aos critérios eminentemente técnicos. No que tange a política e aos bastidores, o mais importante é não deixar de ser você mesmo, agir de forma ética, respeitar a todos, ser simpático e acessível, disponível para ajudar e trabalhar, mas não cair na tentação de, literalmente, “puxar o saco” dos superiores. Se você agir desta forma, certamente estará se igualando a outros competidores, mas perderá sua essência e sua avaliação deixará de ser feita pelo que realmente representa, conquista e realiza em suas ações. Se a empresa, escola, indústria ou qual instituição trabalhar prefere aqueles que adulam a chefia em troca de promoções é melhor procurar outro lugar para trabalhar ou estudar...
De qualquer modo, agir com correção, aprender com os erros, ter personalidade e caráter são elementos essenciais. Manter a cabeça erguida mesmo diante das dificuldades momentâneas, acreditando em você e trabalhando para superar as crises e derrotas inerentes a vida humana são alguns pré-requisitos para virar o jogo. Então, bola pra frente que o jogo continua e ainda há muito o que fazer para virar o placar...
Obs. As histórias do início deste artigo tiveram final feliz pois em todos os casos, apesar das lágrimas e da tristeza evidente pelos insucessos, a estudante superou a nota baixa, concluiu o ensino médio, entrou em concorrido curso de uma das melhores universidades públicas brasileiras; o professor não desistiu dos concursos e algum tempo depois foi aprovado, em primeiro lugar, com nota máxima na prova didática; o coordenador que almejava o cargo de gerente até foi promovido, algum tempo depois, mas acabou saindo da empresa e ingressou em um novo modelo de negócios, numa startup, onde além de prestigiado tem melhor qualidade de vida do que tinha anteriormente.
João Luís de Almeida Machado
Consultor em Educação e Inovação, Doutor e Mestre em Educação, historiador, pesquisador e escritor.
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