Escola, saúde e família na infância
A garantia do direito à saúde da criança remete tanto à família, quanto ao espaço no qual ela mais interage: a Escola
“Viver é muito perigoso... Porque aprender a viver é que é o viver mesmo... Travessia perigosa, mas é a da vida. Sertão que se alteia e abaixa... O mais difícil não é um ser bom e proceder honesto, dificultoso mesmo, é um saber definido o que quer, e ter o poder de ir até o rabo da palavra”.
O texto de Guimarães Rosa, embora destinado a adultos, expressa de forma muito clara o que é ser criança. Viver em um mundo ainda desconhecido, cercado de perigos reais e imaginados, enfrentando exigências e obrigações não totalmente entendidas, com pouco ou nenhum controle sobre suas próprias circunstâncias. A infância, a decantada aurora da vida, é também um período de tensões e estresses.
Entre os grandes estressores – mas também fontes de muita alegria e solidariedade – para uma criança estão a escola, a família e a saúde, vistas de forma global.
Embora algumas situações excepcionais – desastres ambientais, mortes na família, pobreza extrema sejam altamente estressantes para uma criança, pesquisas parecem apontar a escola como um dos maiores agentes traumáticos, se considerarmos situações rotineiras.
Isso acontece não apenas por fatores estritamente acadêmicos, como provas, trabalhos em equipe, questionamentos de professores quanto ao conhecimento ou conduta, mas também pelas próprias relações sociais que se estabelecem entre os alunos, com seus conflitos e alegrias inerentes.
Ser desprezado ou isolado por colegas, perseguido pelos maiores, ser o último a terminar uma lição, não entender uma explicação que toda a classe considerou fácil, ridicularização pública (lamentável, mas infelizmente ocorre), exigências esportivas impossíveis pelas características físicas pessoais, péssimas notas, família disfuncional conhecida e desprezada pelos colegas, e uma diversidade de fatores que provocam nervosismo e ansiedade.
Também não é simples para muitos a mudança de nível escolar, ou de escola, com a consequente perda dos amigos e ambiente conhecido, o que tem afetado mais aos meninos, culturalmente mais avessos às novas amizades. Mudanças de ciclos escolares afetam relacionamentos interpessoais, rendimento intelectual e podem gerar alguns conflitos de adaptação a novos grupos, e muitas vezes a perda de alguns amigos podem ter impacto forte.
Já entre os agentes potencialmente estressores da vida familiar, com certeza o tipo de relacionamento entre pais e filhos ocupa lugar de destaque. Pouco tempo compartilhado, ausência de atividades de lazer em comum, dificuldades dos pais entre si, gerando brigas e confrontos que repercutem sobre os filhos, desempregos, mortes, separações – principalmente quando envoltas em conflitos e acusações de parte a parte – nascimento de irmãos, doença prolongada de algum membro próximo da criança.
Aliás, doenças infantis ou juvenis, com suas dores associadas, períodos de hospitalização, principalmente aqueles associados a doenças crônicas, afetam não somente a própria criança mas principalmente todo o núcleo familiar. Não se pode apostar na incapacidade de perceber como sua debilidade está interferindo na vida dos demais, o que pode eventualmente associar culpa a um quadro já estressante por si. Estas experiências todas tem respostas extremamente individuais, muitas vezes subestimamos a capacidade de reagir das crianças, e somos agradavelmente surpreendidos; porém é indispensável atenção, as perdas e os perigos, na fase em que a estrutura psíquica não está perfeitamente estruturada podem levar a sequelas dificilmente recuperáveis.
O fato inconteste é que nada substitui pais amorosos e professores dedicados, crianças e jovens demandam amizade e interesse real.
Wanda Camargo
Educadora e assessora da presidência do Complexo de Ensino Superior do Brasil.
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